Nos últimos anos, assistentes de IA como o ChatGPT têm sido utilizados como ferramenta de suporte emocional. Mas será que podem realmente substituir a psicoterapia? Esse debate precisa sair da bolha acadêmica e alcançar os profissionais de psicologia antes que a categoria acorde tarde demais para a revolução digital.
Recentemente, em uma discussão com colegas especializados em ciberpsicologia, ficou evidente a falta de debate sobre o impacto da IA na prática clínica e nos conselhos de psicologia. Enquanto isso, profissionais de diversas áreas já adotam IA generativa para criar conteúdo, muitas vezes sem sequer verificar a veracidade das informações. O problema? Médicos e outros profissionais das redes sociais disseminam conteúdos superficiais, baseados em respostas de IA, que acumulam milhares de curtidas e reforçam uma nova geração de fake news sobre transtornos mentais.
Mas o problema discutido aqui hoje não é esse. A grande questão é: a IA pode substituir o profissional de psicologia? A resposta curta: não. Mas nós psicólogos temos que entrar no debate para nos adaptarmos. A promessa da IA na saúde mental é sedutora: acessibilidade 24/7, suporte imediato e personalização para diferentes culturas e contextos. Estudos indicam que chatbots podem ser úteis no suporte inicial e no fornecimento de informações (Haque & Rubya, 2023; Chin et al., 2023). No entanto, IA não oferece vínculo terapêutico, não constrói uma relação de confiança e não conduz um processo psicoterapêutico baseado na singularidade de cada paciente (Siddals, Torous & Coxon, 2024). O máximo que consegue é simular empatia e simulação não trata sofrimento emocional.
Outro risco grave é a falsa sensação de segurança. Pacientes podem desenvolver dependência dessas ferramentas, postergando a busca por psicoterapia adequada e agravando quadros clínicos. A popularização da IA para suporte emocional também pode desvalorizar a prática profissional, já que a ilusão de autoeficácia gerada por respostas rápidas pode convencer o público de que psicoterapia é apenas um conjunto de conselhos genéricos e automáticos (Adamopoulou & Moussiades, 2020).
A verdade é que a IA já está inserida na vida das pessoas e o impacto sobre a psicologia é inevitável. A recusa em discutir essa realidade só contribui para a marginalização da profissão frente à tecnologia. O debate precisa acontecer. E precisa acontecer agora, assumindo o protagonismo no uso ético e responsável dessas ferramentas. A questão não é se a IA pode substituir psicólogos, mas sim se os psicólogos estão dispostos a se adaptar, pois o mercado já vem propondo soluções artificiais e superficiais. O caminho não é negar a IA, mas compreender suas limitações, regulamentar seu uso e encontrar maneiras de integrá-la como um recurso complementar à prática clínica.
Adamopoulou, E., & Moussiades, L. (2020). An Overview of Chatbot Technology. Artificial Intelligence Applications and Innovations: 16th IFIP WG 12.5 International Conference, AIAI 2020, Neos Marmaras, Greece, June 5–7, 2020, Proceedings, Part II, 584, 373–383. https://doi.org/10.1007/978-3-030-49186-4_31
Chin, H., Song, H., Baek, G., Shin, M., Jung, C., Cha, M., Choi, J., & Cha, C. (2023). The Potential of Chatbots for Emotional Support and Promoting Mental Well-Being in Different Cultures: Mixed Methods Study. Journal of medical Internet research, 25, e51712. https://doi.org/10.2196/51712
Haque, M. D. R., & Rubya, S. (2023). An Overview of Chatbot-Based Mobile Mental Health Apps: Insights From App Description and User Reviews. JMIR mHealth and uHealth, 11, e44838. https://doi.org/10.2196/44838
Siddals, S., Torous, J. & Coxon, A. (2024). “Aconteceu de ser a coisa perfeita”: experiências de chatbots de IA generativa para saúde mental. npj Mental Health Res 3 , 48. https://doi.org/10.1038/s44184-024-00097-4